-Eu não quero isso.
-Isso o quê?
-Isso branco, diz ele já pegando a couve-flor com a mão e tirando do prato. Coloca sem a menor cerimônia em cima da minha toalha que estava tão limpinha, ainda com cheiro de amaciante.
Ainda tento, em vão, convencer esse projeto de peste (atenção: eu sou a única pessoa que pode se dirigir aos meus rebentos usando os adjetivos que me derem na telha. Se alguém ousar chamar meu príncipe de qualquer coisa que não seja um elogio sem nenhuma intenção sarcástica, eu mordo. Entendido?)a experimentar um pouquinho, só uma garfada, vá?
E pensar que ao redor dos 8 meses eles comeriam cacos de vidro se a gente desse, só por experimentar. Foram verdadeiros gourmets. Dá uma saudade de ver esses filhotes se lambuzando com lascas de bacalhau, amoras ou folhas de alcachofra.
Honestamente eu não sei como a raça humana conseguiu sobreviver até hoje. Primeiro nascem umas criaturinhas que não conseguem sobreviver sozinhas pelos primeiros anos. Não são como patos que já saem do ovo andando e ciscando. Depois essas criaturinhas se recusam a comer qualquer coisa de nutritivo e que as ajudariam a crescer, ficar forte e mais inteligentes, deixando a espécie humana dois degraus acima na escala evolutiva ao invés de um. Francamente não faz sentido nós chegarmos até aqui só para descobrirmos que temos genes tão burrinhos que só querem comer macarrão na manteiga ou salsicha.
-Mas olha que bonitinho, parece uma árvore, ou uma florzinha. Dá só uma mordidinha. E por favor não coloque na mesa, se você não vai comer alguma coisa deixe no cantinho do prato.
Existem duas maneiras desse garoto experimentar a couve-flor: a primeira vai ser na casa de algum amigo. Assim que a mãe desse amigo fizer o prato do garoto e colocar uma couve-flor, como por encanto essa couve-flor vai virar o nirvana culinário.
-Mamãe, a mãe da Duda fez couve-flor, eu A-D-O-R-E-I. Faz para mim amanhã?
A outra é por pura repetição. Se ele ver os pais e irmãos comendo a dita cuja couve-flor todo dia, depois de alguns meses ele vai querer experimentar, por livre e espontânea vontade. Criança que come sozinha, com prato feito, não desenvolve um paladar explorador. Se quem cozinha e serve também não se empolga com legumes e verduras, não vai fazer nenhum esforço para que ele coma também. Eu não como fígado. O que não quer dizer que eu não tenha acostumado minha prole a comer fígado uma vez por semana. Apresento e trato esse infeliz pedaço de órgão como se fosse picanha ou medalhão de filé mignon. Minha empolgação funciona. Faça as refeições com seu rebento, você vai ver que mudança. Até salada o garoto está comendo agora.
-Eca, que nojo. Não quero isso.
Se pelo menos eu conseguisse que eles comessem abobrinha sem ter que disfarçar embaixo do feijão...